Votar é um direito de todos os que vivem num sistema democrático. Mas para todas as mulheres devia também ser um dever, embora tenham, também, o direito de não votar. Mas recordando a história, não podemos esquecer a nossa ausência ou melhor, afastamento de qualquer decisão política. Fomos ignoradas e consideradas como seres menores. Isto durante séculos. Muitos séculos; demais.
Em meados do século XIX a América estava dividida. A escravatura era o tema dominante em quase todos os círculos de discussão. Duas importantes mulheres -
Susan Brownell Anthony e Elizabeth Cady Stanton - lideravam grupos de luta a favor da abolição da escravatura na América, em 1851.
O pensamento inicial de Susan passava por ver aprovada uma lei que concedesse o direito de voto às mulheres, mas, devido às dificuldades enfrentadas, Susan e Elizabeth concentram-se apenas na libertação dos escravos e só mais tarde no direito ao voto, em 1870. Direito ao voto, por meio da lei constitucional nº. 15, a todos os homens de qualquer raça, cor e condição social. Mas as mulheres não existiam... É iniciada uma nova batalha a favor de uma lei pelo voto feminino, protagonizado pela idealizadora Susan Anthony. A luta seria longa e árdua...Só em 1869, em Wyoming, é pela primeira vez permitido o voto feminino. Três Estados do Oeste seguiriam o exemplo. No entanto, não foi fácil e muitas pessoas ergueram a sua voz contra. Em 1906, a grande defensora do voto feminino Susan Anthony, morre aos 86 anos, sem ver aprovada a (sua) lei para todos os estados norte americanos.
Dez mais anos mais tarde é eleita pelo Estado de Montana a primeira mulher para o Congresso, a deputada
Jeannette Rankin, com a responsabilidade de propor uma lei de voto a todas as americanas. Proposta só aprovada pelo Congresso dos Estados Unidos em 1919 e emendada em 1920, com proibição de discriminação política com base no sexo. Cabe salientar, também, que Jeannette seria o único parlamentar a votar contra a entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial, repetindo o seu voto de 1917, quando da Primeira Guerra.
Do outro lado do globo, a
Nova Zelândia foi o primeiro país do mundo a conceder o direito de sufrágio às mulheres no ano de
1893. A Austrália concedeu o voto em 1902, com algumas restrições. Na Europa, o primeiro país a permitir uma aproximação feminina das urnas de voto foi a Finlândia em 1906.
Em Inglaterra, como havia sucedido noutros países, a concessão de tão importante direito foi difícil e dramática, a culminar em prisões e até morte. É em 1866 apresentada por
John Stuart Mill , famoso jurista, economista e filósofo inglês, ( e assinada também por
miss Sarah Emily Davis e pela Dra. Garret Anderson) a primeira lei mas, sofre uma estrondosa derrota de 194 votos contra 73 a favor. Poucos anos depois, surge uma abertura e as eleições municipais contam com a participação das mulheres que possuiam propriedades, simplesmente. A luta continuou, pelo direito de todas e os protestos intensificam-se, resultando em muitas detenções. Surge então um acontecimento trágico que marca esta luta, num gesto de desespero
Emily Davison, em Junho de 1913, coloca-se em frente do cavalo do rei durante uma prova hípica e acaba por falecer. O seu enterro é seguido por protestos violentos, incêndios e corte de fios do telégrafo. Com o fim da Primeira Grande Guerra, em 1918, é reconhecida a participação feminina na retaguarda do conflito e é finalmente concedido o direito ao voto às mulheres inglesas com mais de 30 anos. Só em 1928, a idade foi reduzida para 21 anos.
Na América Latina, o primeiro país a permitir o voto feminino foi o Equador em 1929. Na Argentina, tal acontecimento sucede no período de Juan Domingo Perón, em 1946, em que é iniciada a campanha pelo voto feminino, através de sua esposa
Evita, que empenha-se bastante por essa conquista - aprovada pelo Congresso em 23 de Setembro de 1947.
Em
Portugal, o processo é, mais uma vez, muito lento e difícil. Só depois da revolução de 25 de Abril de 1974 todas as mulheres portuguesas conseguem esse direito. Em 1910, tendo em consideração a omissão legal sobre o sexo do chefe de família,
Carolina Beatriz Ângelo - médica, viúva e mãe de duas crianças- faz prevalecer a sua condição de chefe de família e deposita o primeiro voto feminino nas eleições para a Assembleia Constitucional. Como consequência, a lei é modificada de forma a estabelecer claramente que só os homens podiam exercer o direito de voto. Anos mais tarde, em
1931 por meio do decreto de lei nº 19.694, de 5 de Maio, as mulheres com um grau universitário ou com o secundário concluído podiam repetir o mesmo gesto de Carolina Beatriz Ângelo. Em contrapartida, os homens podiam exercer o mesmo direito desde que soubessem ler e escrever.
A Lei nº 2.015, de 28 de Maio de 1946, alargou um pouco mais o direito de voto, mas ainda continha requisitos diferentes para os homens e para as mulheres eleitores da Assembleia Nacional. A Lei nº 2.137, de 26 de Dezembro de 1968, definiu a capacidade eleitoral activa para a Assembleia Nacional, sem distinguir quanto ao sexo. Todavia, apenas os chefes de família podiam ser eleitores das Juntas de Freguesia. Só o decreto-Lei nº 621/A/74, de 15 de Novembro, declarou serem eleitores da Assembleia Constituinte "cidadãos portugueses de ambos os sexos" (artigo 1º). É finalmente em 1976 que a Constituição da República reconhece o direito de sufrágio a todos os cidadãos maiores de dezoito anos (artigo 49º), "ressalvadas as incapacidades previstas na lei geral " (artigo 49º), assegurando, portanto igual direito de voto aos homens e mulheres nas eleições para os órgãos de soberania, das regiões autónomas e do poder local.
Para a nossa história ficam mulheres como:
Carolina Michaelis de Vasconcelos, Maria Amália Vaz de Carvalho,Maria da Lourdes Pintasilgo, Maria Teresa Horta, Maria Isabel Barreno, Maria Velho da Costa, entre outras, muitas outras.
Por todos os que lutaram pelo meu (e de todas as mulheres) direito ao voto um profundo agradecimento. Por elas e por eles, pelas que ainda não podem exercer tal acto e pelas minhas convicções eu fui (e espero continuar) a votar.